Com o passar dos anos, conforme a equipe da Solana foi resolvendo problemas em seu código, os tempos de bloco — isto é, o intervalo para a rede produzir novos blocos de transações — diminuíram, chegando até mesmo a ficar abaixo do limite considerado padrão de 400ms da Solana.
No último mês, porém, uma dinâmica curiosa veio à tona: o tempo médio dos blocos subiu consideravelmente, levando a Solana a incorporar novas transações à blockchain mais devagar que antes. Isso ocorreu em função de uma nova estratégia entre os validadores, que perceberam ser mais lucrativo produzir os blocos de forma lenta. Segundo apuração do Blockworks, Anza, Jito e Marinade já avaliam alternativas para resolver o problema.
Os períodos de epoch da Solana aumentaram drasticamente em junho. Fonte: Kamino
Em cada bloco da Solana, um validador exerce o papel de líder — é ele quem reúne as transações, monta o bloco e o transmite para o restante da rede. Os líderes recolhem as taxas das operações registradas nos blocos. Quanto maior o volume de transações, maior o potencial de receita em taxas; portanto, pode ser mais interessante para o validador processar, por exemplo, 500ms de transações do que apenas 300ms.
No nível prático, alguns validadores da Solana estão aguardando o máximo de tempo possível antes de fechar os blocos, buscando maximizar seus ganhos — consequência direta desse comportamento é o aumento dos períodos de epoch da rede.
Esse cenário está longe do ideal para uma blockchain que se vende como tão rápida quanto a Nasdaq. E menos epochs por ano significa menos oportunidades de capitalização das recompensas de staking para os detentores de tokens, como destacou o CTO da Sol Strategies, Max Kaplan.
A Solana adota um mecanismo chamado “grace ticks”, espécie de janela extra para que o líder ainda possa submeter blocos com êxito. A medida impede que validadores localizados em regiões distantes sejam prejudicados injustamente, mas também abre espaço para atrasos propositais.
O Frankendancer, cliente alternativo para a Solana, lançou recentemente um agendador voltado à maximização de receita, e validadores que utilizam essa ferramenta estão aumentando, mesmo que levemente, o tempo de fechamento dos blocos, de acordo com Kaplan.
Kaplan observou que o atraso causado pelo Frankendancer é discreto se comparado a validadores que deliberadamente retardam a rede, e que não considera isso um problema. Além disso, não se trata de uma novidade no universo das blockchains proof-of-stake; o diferencial é que a atualização do Firedancer acabou evidenciando a estratégia na Solana. Procurada, a Jump não respondeu de imediato ao pedido de comentário.
De forma interessante, o engenheiro de software da Firedancer, Michael McGee, explicou esse fenômeno no episódio mais recente do podcast Lightspeed.
“Uma coisa que percebemos com nosso validador atual… [é que eles] podem, muitas vezes, obter um bloco mais rentável ao atrasar a execução das transações”, pontuou McGee.
Segundo o analista Victor Pham, do Blockworks Research, quem mais tem retardado propositalmente os blocos da Solana geralmente está executando versões modificadas do cliente Agave-Jito.
Para ilustrar, durante o epoch 802 em meados de junho, Galaxy e Kiln registraram tempos medianos de bloco superiores a 570ms cada. Outros validadores sem identificação também apresentaram lentidão, enquanto os validadores da Temporal alcançaram 475ms de tempo médio por bloco, conforme dados do Solana Compass.
O cofundador da Kiln, Ernest Oppetit, reconheceu que o validador — sexto maior da Solana em staking — vinha atrasando as slots “por um período”, mas garantiu que a prática foi interrompida.
“Na Kiln, temos como princípio oferecer o melhor rendimento (APY) de staking do mercado sem descuidar da segurança. Realizamos P&D em diferentes camadas, incluindo estudos sobre ajuste de tempo, e mantemos diálogo contínuo com nossos clientes, equipes e a fundação. Neste momento, seguimos à risca as especificações e não estamos mais atrasando blocos, mas muitos participantes continuam agindo assim. Em nossa opinião, o problema de incentivos (blocos mais rápidos geram recompensas menores) deve ser corrigido diretamente no protocolo”, afirmou Oppetit.
“Posso afirmar que não fomos nós que trouxemos esse tema à tona”, comentou Ben Coverston, diretor de engenharia da Temporal, ao ser questionado sobre a participação do validador na onda de blocos lentos.
“Como provedores de serviço, priorizamos configurações de validadores que maximizem as recompensas de staking dos nossos clientes. Na Solana, isso pode significar produzir blocos um pouco mais lentos para garantir maior captura de lucros. A Galaxy, por sua vez, permanece aberta ao retorno da comunidade e já ajustou seus tempos de bloco para níveis aceitáveis”, declarou um porta-voz da Galaxy.
A comunidade de validadores da Solana desaprova fortemente o enfraquecimento do desempenho da rede, e esses validadores mais lentos agora são alvo de críticas públicas.
Ao que tudo indica, punições mais severas estão por vir. O Blockworks apurou que a Jito planeja excluir validadores lentos de seu pool de staking — o maior da rede.
Brian Smith, presidente da Jito Foundation, afirmou que a entidade está “redigindo uma proposta de governança que permitirá a um comitê remover validadores lentos do pool de delegação do JitoSOL. Em alguns dias, o texto deve ser disponibilizado para consulta da comunidade.”
Michael Repetny, cofundador do terceiro maior pool de staking, Marinade, informou que a plataforma está considerando submeter à comunidade uma proposta de governança que aborde os prós e contras de estabelecer a lentidão dos validadores como critério para exclusão da estratégia de delegação.
Também há iniciativas em desenvolvimento no próprio protocolo. O repositório do Anza no GitHub traz uma proposta para reduzir pela metade o período dos “grace ticks” na Solana. A reestruturação sugerida para o consenso da rede também deve resolver a questão.
“O Alpenglow vai permitir que se pule blocos via votos, resolvendo o problema”, explicou Brennan Watt, vice-presidente de engenharia principal da Anza.
Segundo Watt, em entrevista ao podcast Lightspeed, a intenção é que o Alpenglow já esteja na mainnet até a conferência Breakpoint da Solana, em dezembro.
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